ECOTEOLOGIA- PARTE 12-UNIDADE 3- ESPIRITUALIDADE RESPONSÁVEL EM FACE À DEGRADAÇÃO DA NATUREZA- CONCLUSÃO

 


Nesta Unidade, deixamos o olhar espiritual ser o olho que vê onde a realidade precisa de nós como contemplação na ação. O Mistério do Criador está em todas as nuances da vida, nas plantas, nos caminhos, nas paisagens, no orvalho e nos presenteia em cada amanhecer e anoitecer com a obra da criação. É preciso, então, encontrar essa verdade em todas as coisas. São Boaventura afirma que “[a] contemplação é tanto mais elevada quanto mais o ser humano sente em si mesmo o efeito da graça divina ou quanto mais sabe reconhecer Deus nas outras criaturas” (in Sententiarum, 23,2-3).

O mundo é bom, porque Deus é o Sumo Bem. Nas coisas ínfimas, Ele é grande, nas coisas grandiosas, Ele se esconde com simplicidade absoluta. Temos que experimentar o que liga Deus a todos os seres vivos, essa mediação entre o natural e o sobrenatural. Na Laudato Sì, o Papa Francisco destaca Francisco de Assis “[...] como exemplo por excelência pelo cuidado pelo que é frágil, vivida com alegria e autenticidade. É o padroeiro de todos os que estudam e trabalham no campo da ecologia, amado também por muitos que não são cristãos” (FRANCISCO, 2015, p. 10).

Todos os biógrafos de São Francisco, como Tomás de Celano e Boaventura de Bagnoreggio, frisam a união que ele tinha com as criaturas, sua ternura, simpatia e extremo cuidado com todas as coisas. Leonardo Boff ( 2021, p. 294) reitera que hoje 

[...] São Francisco se tornou o irmão universal que se situa para além das confissões e das culturas. A humanidade pode se orgulhar de ter produzido um filho com tal amor, com tanta ternura e com tão grande cuidado para com todos os seres, por menores que parecessem. Ele é uma referência espontânea de uma atitude ecológica que se confraterniza com todos os seres, convive amorosamente com eles, os protege contra as ameaças e os cuida como irmãos e irmãs. Ele soube descobrir Deus nas coisas. Acolheu com jovialidade as doenças e as contradições da vida. Chegou a chamar de irmã a própria morte. Estabeleceu uma aliança com as raízes mais profundas da Terra e com grande humildade se unia a todos os seres para cantar, junto com eles e não apenas através deles, louvores à beleza e à integridade da criação.

Mais do que um homem medieval, santo, cristão e católico, Francisco é um arquétipo, ou seja, um modelo a ser admirado, amado, imitado e seguido em seus valores, virtudes e propósitos, porque “[...] penetrou no inconsciente coletivo da humanidade, no Ocidente e no Oriente e de lá anima as energias benfazejas que se abrem à relação amorosa com todas as criaturas, como se estivéssemos ainda no paraíso terrenal” (BOFF, 1986, [n. p.]).

Francisco de Assis foi um homem reconciliado com tudo: com Deus, com as pessoas, com os detalhes da natureza na sua flora e fauna. Não pode ser visto apenas como o santo dos animais, mas sim um ser que disse um sim a vida que está em meio a tudo, nas cavernas, nas estradas, nas florestas, nas cidades, ruas e praças assumindo a vida como ela é.

IMPORTANTE

“Os sacramentos constituem um modo privilegiado em que a natureza é assumida por Deus e transformada em mediação da vida sobrenatural. Através do culto, somos convidados a abraçar o mundo num plano diferente. A água, o azeite, o fogo e as cores são assumidas com toda a sua força simbólica e incorporam-se no louvor. A mão que abençoa é instrumento do amor de Deus e reflexo da proximidade de Cristo, que veio para Se fazer nosso companheiro no caminho da vida. A água derramada sobre o corpo da criança batizada, é sinal de vida nova. Não fugimos do mundo, nem negamos a natureza, quando queremos encontrar-nos com Deus. Nota-se isto particularmente na espiritualidade do Oriente cristão. ‘A beleza, que no Oriente é um dos nomes mais queridos para exprimir a harmonia divina e o modelo da humanidade transfigurada, mostra-se em toda a parte: nas formas do templo, nos sons, nas cores, nas luzes, nos perfumes’. Segundo a experiência cristã, todas as criaturas do universo material encontram o seu verdadeiro sentido no Verbo encarnado, porque o Filho de Deus incorporou na sua pessoa parte do universo material, onde introduziu um gérmen de transformação definitiva: ‘O cristianismo não rejeita a matéria; pelo contrário, a corporeidade é valorizada plenamente no ato litúrgico, onde o corpo humano mostra sua íntima natureza de templo do Espírito Santo e chega a unir-se a Jesus Senhor, feito também Ele corpo para a salvação do mundo’”. (FRANCISCO, 2015, p. 134)

 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAUMAN, Z. Vida líquida. Tradução de Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2007.

BENTO XVI, Papa. Carta Encíclica Caritas in Veritate. 2ªed. São Paulo: Edições Loyola, 2009.

BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada Vozes, 13.ed. Petrópolis: Editora Vozes, 1990.

BOFF, L. Francisco de Assis: saudade do paraíso. Petrópolis: Editora Vozes, 1986.

BOFF, L. O doloroso parto da Mãe Terra: Uma sociedade de fraternidade sem fronteiras e de amizade social. Petrópolis: Editora Vozes, 2021.

CATECISMO da Igreja Católica. São Paulo: Loyola, 2000.

CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL – CNBB. A Igreja e a

questão ecológica. Leitura ético-teológica a partir da análise crítica do desenvolvimento. São Paulo, Edições Paulinas, 1992.

CONFERÊNCIA EPISCOPAL DO PARAGUAI. Carta pastoral El campesino paraguayo y la tierra. [S. l.], jun. 1983. Disponível em: https://episcopal.org.py/?news=el-campesino-paraguayo-y-la-tierra-12-de-junio-de-83/. Acesso em: 11 mai. 2021.

FRANCISCO, Papa. Carta Encíclica Laudato Si – Louvado Seja – Sobre O Cuidado Da Casa Comum. São Paulo: Editora Loyola, 2015.

FRANCISCO, Papa. Exortação apostólica Evangelii Gaudium. Vatican, nov. 2013.

Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/apost_exhortations/documents/papa-francesco_esortazione-ap_20131124_ evangelii-gaudium.html. Acesso em: 24 ago. 2021.

MURAD, A. (Org.). Ecoteologia: um mosaico. São Paulo: Editora Paulus, 2016.

NERY, Frei Prudente OFM Cap. Celebração do Ano 2000: Subsídios da Família Franciscana em preparação ao novo milênio. Petrópolis: Editora Vozes, 1999.

Texto originalmente publicado pela USF- FREI VITORIO MAZZUCO FILHO




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