Reflexões Franciscanas - 17



39. Ordálio (Mubahâla), era uma fogueira feita em público para que por entre chamas, fogo e brasas, numa prova de coragem e fé, as pessoas a atravessassem incólumes. O sultão propõe o desafio, chama seus doutores para que o façam junto com Francisco. É um testemunho público de uma fé levada ao fogo da experiência. Já havia acontecido esta cena em Medina, onde Maomé, frente a uma delegação de cristãos e seu bispo, tinham que se submeter à autoridade civil do profeta. Em Medina, discutiram sobre o significado da Paixão de Jesus Cristo e tiveram que provar a verdade da Encarnação, a Divindade de Jesus Cristo, diante do ordálio de fogo. Maomé queria que os cristãos pedissem o regresso imediato de Cristo e reconhecessem a sua missão profética. Os cristãos não aceitaram o desafio, queriam apenas negociar as ideias teológicas. Perderam a chance de fazer com que a doutrina cristã da Divindade, Paixão e Encarnação fosse mais conhecida por parte dos muçulmanos. Mas em Damieta, novamente vem a prova de fogo. Há uma nova atitude; o santo de Assis é um profeta de Deus diante do Islam. De repente, os dois lados percebem, um pelo Corão outro pelo Evangelho, que estão na mesma busca: ser capaz de testemunhar a fé pela vida e pela morte; a reparação de um sofrimento causado por tantas lutas, batalhas, saques e massacres; manifestar uma caridade que vem de um amor sagrado; as boas obras muçulmanas e a caridade cristã; não julgar, mas dialogar; reconhecer os dons do Altíssimo e fazer-se Irmãos. Fazer ou não fazer o ordálio não é fundamental, o importante é saber que tanto cristãos e muçulmanos não podem desafiar o juízo de Deus, nem duvidar da fé do diferente, mas ter a postura do sultão que diz para Francisco: “Creio que vossa fé é boa e verdadeira”.

40. Melek-el-Kamel viu em Francisco um dom de amor, na coragem de expor sua vida ao martírio se fosse preciso, para dialogar na força da fé. Francisco, em primeiro lugar ama os muçulmanos e a partir daí pode falar de seu Deus. Uma experiência tão forte que se transforma em Regra de vida, onde é compilado um capítulo todo a falar para os frades que quiserem partir para junto dos sarracenos (Rnb 16). Testemunhar o Evangelho na vivência de virtudes cristãs. Vivência e não violência. Não provocar litígios nem contendas, mas serem submissos a toda criatura humana por amor do Senhor. Ir para junto de um modo humilde, pobre, com muita doçura e mansidão e por fim pregar a verdade cristã! O diálogo religioso para os Franciscanos não é mais um simples dado histórico, cultural e eclesial, mas é definitivamente Forma de Vida!

Frei Vitório

Na imagem de Fra Angelico, o ordálio é visto na parte inferior.

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