ECOTEOLOGIA PARTE 5 - CUIDADO DA CRIAÇÃO E PREOCUPAÇÕES SOCIOAMBIENTAIS
A
questão da água abrange os quesitos dos recursos hídricos, os problemas das
enchentes e tantas outras questões técnicas. O fato de ser um elemento
essencial, impacta nos aspectos científicos e antropológicos. A água se torna
ainda uma questão ética, pois diz respeito:
- À qualidade da água (que é diferente para os que moram nas periferias empobrecidas da dos condomínios privilegiados);
- Ao sistema de represamento e
- Ao grande desperdício.
Assim,
podemos observar que as questões relacionadas à água são muito mais amplas, abrangem,
entre outras coisas, o direito que todos têm à água potável e a sua importância
para a vida e saúde. Os ecossistemas e a vida humana não se separam. A não
qualidade da água incide com a mortalidade infantil, doenças (tais como
diarreias, viroses, cólera etc.).
Os aquíferos, que são formações geológicas nos subsolos que contêm águas, e que acabam por se caracterizarem como uma grande riqueza, são também a garantia de reservas para o futuro, mas hoje são adquiridos e explorados por grupos privados e sofrem as consequências das poluições que vêm da química agrotóxica, do lixo industrial e depósitos de lixo. Como resultado, os lençóis freáticos são contaminados. O esgotamento dos recursos naturais tem a ver com o desperdício excessivo, inclusive a prática de jogar água fora sem o cuidado de reutilização.
A vida humana gira em torno da importância da água, pois ela é responsável pelo sadio da vida humana, quando limpa, potável, destilada e mineral. Ela atua e sustenta os ecossistemas, tanto da terra quanto dos oceanos.
Como fazer funcionar os setores sanitários, a agropecuária e todo o sistema industrial? A procura excede à oferta. Posto de outro modo, as grandes cidades e seus edifícios dependem dos grandes sistemas de reservas hídricas, que cada vez mais não conseguem ter o seu volume controlado e, na maioria das vezes, estão abaixo do nível esperado. Isso porque, como exposto anteriormente, a distribuição da água não é igual para a população entre os países ricos e pobres. Os países que sofrem grandes períodos de seca não conseguem resolver a produção suficiente de alimentos e à fome se une a questão da água. Entre os pobres e seus lugares onde habitam, a qualidade da água é ruim, sem tratamento, e isso mata. A água está privatizada nas mãos de grandes grupos que a transformam em mercadoria, com preço nem sempre acessível.
Nem sempre pensamos que saneamento básico é prioridade para governanças. Obras que estão debaixo da terra não aparecem como os grandes viadutos, edifícios, monumentos e praças. As valetas, esgoto ao ar livre, descargas humanos e industriais chegam aos rios e às fontes. Os produtos químicos alcançam rios, mares, lagos, riachos e lagoas.
IMPORTANTE
Tendo
isso em vista, é imprescindível salientarmos, por intermédio das palavras do
Papa Francisco que, “[e]nquanto a qualidade da água disponível piora
constantemente, em alguns lugares cresce a tendência para se privatizar este
recurso escasso, tornando-se uma mercadoria sujeita às leis do mercado. Na
realidade, o acesso à água potável e segura é um direito humano essencial,
fundamental e universal, porque determina a sobrevivência das pessoas e, portanto,
é condição para o exercício dos outros direitos humanos. Este mundo tem uma
grave dívida social para com os pobres que não têm acesso à água potável,
porque isto é negar-lhes o direito à vida radicado na sua dignidade inalienável.
Esta dívida é parcialmente saldada com maiores contribuições econômicas para
prover de água limpa e saneamento as populações mais pobres. Entretanto nota-se
um desperdício de água não só nos países desenvolvidos, mas também naqueles em
vias de desenvolvimento que possuem grandes reservas. Isto mostra que o problema
da água é, em parte, uma questão educativa e cultural, porque não há
consciência da gravidade destes comportamentos num contexto de grande
desigualdade. Uma maior escassez de água provocará o aumento do custo dos
alimentos e de vários produtos que dependem do seu uso. Alguns estudos
assinalaram o risco de sofrer uma aguda escassez de água dentro de poucas
décadas, se não forem tomadas medidas urgentes. Os impactos ambientais poderiam
afetar milhares de milhões de pessoas, sendo previsível que o controle da água
por grandes empresas mundiais se transforme numa das principais fontes de
conflitos deste século”. (FRANCISCO, 2015, p. 25-26)
São
2700 km de extensão e mais de 13 milhões de habitantes distribuídos em inúmeras
cidades, mais de 450 municípios, tais como as seguintes cidades importantes na história
do rio:
- Três Marias (MG) onde está sua nascente;
- São Roque de Minas (MG);
- Pirapora (MG);
- Juazeiro (BA);
- Petrolina (PE);
- Paulo Afonso (BA);
- Brejo Grande (SE);
- Penedo (AL) na foz.
O Rio São Francisco é tão importante para a história nacional, em virtude de que, na questão da água, ele é por si só uma questão de vida e morte. Quando um povo começa a ir embora das margens é porque o rio está definhando. Grandes fazendas de gado e grandes projetos agroindustriais interferem na vida do rio. Se o rio um dia foi canal para a expansão do conhecimento do nosso território, hoje ele é itinerário da expansão do capital. Essa é a sua segunda exploração e invasão. Se um dia os índios de suas beiras foram exterminados, hoje são os pobres. Eles estão fora dos grandes projetos que exploram as riquezas naturais do grande rio.
Isso posto, é importante lembrar que o desmatamento sem limites do seu bioma característico (que é o cerrado e as matas ciliares) interfere demais nas condições das águas do rio. O solo arenoso do cerrado faz a natural captação e depósito das águas da chuva, que alimenta o São Francisco e seus afluentes. A produção de carvão, para a siderurgia, as mega plantações da monocultura do eucalipto, além de dizimar o cerrado, vão secando as fontes das águas correntes que alimentam o grande rio.
Mil hectares por dia são desmatados, sofrendo, também, as consequências as matas das beiras do rio, as matas ciliares, que são protetoras do leito do rio e importantes para peixes, pássaros e outros animais. Cresce o assoreamento do rio desde as suas fontes por causa da ocupação de suas margens e, com isso, ele, que antes tinha as águas límpidas, hoje carrega dejetos das indústrias, rejeitos da mineração, resíduos de adubo químico, esgotos e lixo das cidades, agrotóxicos e recebe grande volume advindo dos esgotos a céu aberto. Os esgotos de Belo Horizonte também vão para o rio, e o povo bebe a água contaminada, sem tratamento.
SAIBA MAIS
Para aproveitar o potencial energético do rio São Francisco, concretiza-se a política agressiva das construções de barragens que têm consequências ecológicas criminosas, influindo na pesca e nas plantações. Se melhorou para a indústria não melhorou a vida do povo que vai adoecendo com alergias, doenças bronco-pulmonares, câncer, perda de visão, abortos, fortes dores de cabeça e febre. Nas palavras de Dom Frei Luiz Flávio Cappio:
Vamos aprendendo com São Francisco, o santo do rio, a comunhão fraterna de toda a Natureza. Ser semeadores de vida para as gerações futuras plantando muitas árvores pela pureza das águas. Iniciar um profundo e amplo trabalho de educação ecológica. Cessar o desmatamento dos cerrados e a implantação de monoculturas de eucalipto no Alto e Médio São Francisco. Iniciar um programa urgente de recomposição das matas ciliares do rio e seus afluentes, promovendo uma rigorosa fiscalização sobre a destruição das matas remanescentes. Fazer um levantamento criterioso e detalhado sobre as atividades poluidoras do rio, promovendo uma fiscalização eficaz. Iniciar programas de saneamento básico e a instalação de estações de tratamento para esgotos sanitários. Promover a valorização e a proteção de ecossistemas da bacia do São Francisco, que estão sendo veloz e silenciosamente destruídos: cerrados, mata seca, caatingas, lagoas marginais, várzeas e manguezais. Promover um gerenciamento do múltiplo uso das águas do rio, irrigação, geração de energia, consumo doméstico e industrial, que seja racional, justo, democrático e solidário com as gerações presentes e futuras. Promover um amplo debate sobre as consequências do modelo de desenvolvimento em curso, ecologicamente insustentável, concentrador de terras, excludente em relação aos pequenos produtores ribeirinhos e voltado para a exportação. Democratizar o planejamento dos programas e ações de desenvolvimento do vale, com a participação ativa dos setores sociais, hoje marginalizado e penalizado pelas atuais políticas. Desenvolver e difundir técnicas alternativas e sustentáveis de agricultura, com base na agroecologia, que aliadas a uma política agrária desconcentrada viabilizem e fortaleçam a pequena produção diversificada de alimentos provocando, consequentemente, a fixação do homem no campo e a melhoria de vida para os pequenos agricultores da região. Pesquisar alternativas de produção de energia que propiciam a reorientação da política energética em vigor. Reorientar os incentivos à industrialização, viabilizando a implantação descentralizada de pequenas indústrias e unidades de beneficiamento não poluentes, cujo produto final seja também de consumo local ou regional. Reorientar a política e a prática educacionais na região, erradicando o analfabetismo e promovendo uma melhor compreensão da realidade, a valorização das culturas locais e regionais, o exercício da cidadania e uma relação de respeito e interação equilibrada com o meio ambiente. Promover a solidariedade internacional, na busca de reverter as relações de dominação que tornam regiões pobre como o Vale do São Francisco ainda mais pobres. (CAPPIO, 2004, p. 5-10)
Apesar de este ser um assunto muito debatido, ao longo dos anos, o fato é que a destruição do Rio São Francisco continua relevante por causa de megaprojetos que atentam contra a natureza ainda nos dias atuais. O referido Rio é apenas um exemplo de que a água faz parte do equilíbrio do sistema da mãe terra, pois este nosso planeta, em sua maior parte é composto de água. A harmonia da terra depende da água dos rios, dos lagos, dos mares, dos oceanos e das fontes subterrâneas. Logo, desiquilibrar as águas é desiquilibrar a terra.
Dentre os recursos naturais, a água já vai dando mostras cada vez maior escassez, de quão pouca água potável temos disponível para o nosso consumo. À vista disso, implica-se a necessidade do cuidado com esse bem natural, que é patrimônio de todos, mas que vem sendo cada vez mais privatizada, o que a impede de ser acessível a todos.
IMPORTANTE
Em seu estudo, Leonardo Boff (2004, p. 12-13) defende que, no atual contexto geopolítico, “[h]á grande disparidade na distribuição dos recursos hídricos na Terra. 60% da água está em apenas 9 países, entre eles o Brasil, enquanto 80 países (40%) enfrentam a escassez. Pouco menos de 1 bilhão de pessoas consomem 86% da água existente, 1,4 bilhões de pessoas não têm acesso a quantidade suficiente de água potável, isso equivale a oito vezes a população do Brasil, e 2 bilhões não dispõem de um sistema de purificação de água de esgoto. 50% da água tratada é desperdiçada. Pior ainda: 85% das doenças nos países pobres estão ligadas à quantidade e à qualidade da água.
O cenário brasileiro é promissor e, ao mesmo tempo, preocupante. Detemos 13% de toda água doce do planeta, 5,4 trilhões de metros cúbicos, mas ela é desigualmente distribuída: abundante na região amazônica e no Pantanal e escassa no semiárido nordestino, onde vivem 28% da população, dispondo de apenas 5% de recursos hídricos. O Sul e o Sudeste, onde vivem 60% da população são úmidos, mas escasseia água limpa. Ademais, 39 milhões de brasileiros não tem acesso à água tratada (23% da população), o que explica o índice de mortalidade infantil na ordem de 29 a cada mil nascidos. 46% da água que usamos é desperdiçada; daria para abastecer toda a França, Bélgica, Suíça e norte da Itália.
Embora
os países estejam elaborando regras de gerenciamento da água, não existe uma
legislação internacional sobre a questão. A ONU fez o alerta de que no futuro
haverá guerras para garantir acesso à água potável. Da guerra do petróleo à
guerra da água. Mercantilizar a água para daí extrair o lucro. Visite cidades
do nosso país que têm Parque das Águas e verá que esses parques e suas fontes
pertencem a multinacionais. Para entrar e consumir você tem que pagar. A fonte
da vida torna-se fonte de lucro.
3. PERDA DA BIODIVERSIDADE
A
biodiversidade compreende as espécies de seres vivos que existem na biosfera
com toda a sua diversidade, que podem ter existido em determinadas épocas e
continuam a existir; e abrangem regiões com seus biomas, mas sempre na diversidade.
As riquezas dos recursos da terra são preciosas, mas conheceram a depredação. E
o uso utilitarista da biodiversidade sabemos de onde vem: a atividade econômica
e comercial com uma desenfreada produção.
Florestas
e reservas minerais destruídas, exterminam espécies. Sem a diversidade das
espécies não teremos um futuro saudável em termos de alimentação e soluções
clínicas para a cura de enfermidades. A genética busca recursos na diversidade
das espécies, mas sem regulamentar a exploração, não teremos mais matéria
prima.
- O que sabemos sobre algas, vermes, fungos, mangues? Quão importantes são para o geossistema?
- Como o ser humano pode intervir em face dos desastres causados na natureza, se causada exatamente devido à exploração da natureza feita pelo próprio ser humano?
- Como empreender alternativas para sanar os efeitos nocivos?
Existem
cientistas pesquisando e técnicos estudando os melhores modos para implementar boas
intervenções de preservação. Mas sabemos que muitos destes sofrem perseguições de
grupos de interesse no uso irresponsável da natureza. Ambientalistas sabem que
têm a própria vida ameaçada por defenderem que a vida está, sim, ameaçada no
seu todo. Uma terra linda, rica de paisagens naturais e de recursos, mas que
está se tornando poluída, descolorida, enfumaçada e cinzenta. Nós, seres
humanos, temos limites para adentrarmos em certos lugares já contaminados, mas
o consumo, não tem limites para entrar.
IMPORTANTE
Voltando-nos, novamente, para a Encíclica Laudato Si, devemos frisar que “[q]uando se analisa o impacto ambiental de qualquer iniciativa econômica, costuma-se olhar para os seus efeitos no solo, na água e no ar, mas nem sempre se inclui um estudo cuidadoso do impacto na biodiversidade, como se a perda de algumas espécies ou de grupos animais ou vegetais fosse algo de pouca relevância. As estradas, os novos cultivos, as reservas, as barragens e outras construções vão tomando posse dos habitats e, por vezes, fragmentam-nos de tal maneira que as populações de animais já não podem migrar nem mover-se livremente, pelo que algumas espécies correm o risco de extinção. Existem alternativas que, pelo menos, mitigam o impacto destas obras, como a criação de corredores biológicos, mas são poucos os países em que se adverte este cuidado e prevenção. Quando se explora comercialmente algumas espécies, nem sempre se estuda a sua modalidade de crescimento para evitar a sua diminuição excessiva e consequente desequilíbrio do ecossistema.
O cuidado dos ecossistemas requer uma perspectiva que se estenda para além do imediato, porque, quando se busca apenas um ganho econômico rápido e fácil, já ninguém se importa realmente com a sua preservação. Mas o custo dos danos provocados pela negligência egoísta é muitíssimo maior do que o benefício econômico que se possa obter. No caso da perda ou dano grave dalgumas espécies, fala-se de valores que excedem todo e qualquer cálculo. Por isso, podemos ser testemunhas mudas de gravíssimas desigualdades, quando se pretende obter benefícios significativos, fazendo pagar ao resto da humanidade, presente e futura, os altíssimos custos da degradação ambiental”. (FRANCISCO, 2015, p. 28)
Precisamos fazer justiça a países que priorizam a conservação da natureza, na terra e no mar, procurando restaurá-la ao que era a sua constituição original. Talvez, nós que aqui habitamos, não compreendemos o porquê de priorizar o discurso e as práticas sobre a defesa da Amazônia, das florestas tropicais, das bacias fluviais, dos lençóis freáticos, do Pantanal, e dos polos glaciares. Queimadas e derrubadas, terraplenagens, garimpos, loteamentos e condomínios, sem a devida análise de impacto ambiente, produzem perda de biodiversidade, mas nem sempre isso está na pretensa verdade do marketing empresarial. Por um lado, a substituição da flora silvestre por monoculturas de arvores florestais, não só causa grande impacto na biodiversidade da flora, como também da fauna que nela abriga.
IMPORTANTE
Por outro lado, nas palavras do Papa, “[o]s oceanos contêm não só a maior parte da água do planeta, mas também a maior parte da vasta variedade dos seres vivos, muitos deles ainda desconhecidos para nós e ameaçados por diversas causas. Além disso, a vida nos rios, lagos, mares e oceanos, que nutre grande parte da população mundial, é afetada pela extração descontrolada dos recursos fictícios, que provoca drásticas diminuições dalgumas espécies.
E, no
entanto, continuam a desenvolver-se modalidades seletivas de pesca, que descartam
grande parte das espécies apanhadas. Particularmente ameaçados estão organismos
marinhos que não temos em consideração, como certas formas de plâncton que
constituem um componente muito importante da cadeia alimentar marinha e de que
dependem, em última instância, espécies que se utilizam para a alimentação
humana” (FRANCISCO, 2015, p. 29).
Entre tantas outras vidas marinhas, como corais, peixes e algas que estão ameaçadas, a qualidade de nossas vidas também é afetada, com o aumento das temperaturas, em virtude das queimadas e desflorestamentos, com a escassez de alimentos advinda da utilização de “[...] métodos de pesca destrutivos, nomeadamente os que utilizam cianeto e dinamite” (FRANCISCO, 2015, p. 30), que afeta, sobretudo, aos mais humildes.
Estamos fazendo pressão suficiente e eficiente sobre nossa governança, cobrando de onde vêm e para onde vão as licitações? É indispensável que os governos invistam e apoiem as pesquisas para atenuar e sanar o impacto sobre o meio ambiente. Somos criaturas entre as criaturas e estamos interligados. Todos precisam de todos e de tudo. Isto não deve ser apenas um conselho, mas a concretização em programa de soluções que evitem extinções.
Texto originalmente publicado pela USF- FREI VITORIO MAZZUCO FILHO
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