Francisco de Assis e a Encarnação – De Greccio para todos os cantos do mundo - 2

 


A Luz que vem do alto entra na poeira da estrada e faz tudo mais transparente. Às vezes a Palavra pregada, teologada e estudada esconde demais de um modo opaco, aquilo que pode ser representado em detalhes de vida. Deus se dá em pedaços de inteireza, porque tem hora que é pão e tem hora que é versículo; sabe ser migalhas para saciar a fome de muitos; e estas migalhas se transformam em centelhas da energia divina que trabalha sobre nós e nos recria. O presépio refaz o Gênesis mostrando como a Palavra faz tudo ser novamente uma bela, nova e boa notícia.  Francisco de Assis de Assis não conhece Palavra que não seja encontro pessoal. Ele não lê a Palavra, mas faz um encontro de intensa intimidade; uma união transformadora de esfregar corpo, mente, alma e coração na Escritura.  Aprendeu as perfeições divinas nas perfeições do natural. Para ele, Deus não é invisível nem imperceptível, pois não dá para tornar amável o que não se vê.

Para Francisco de Assis, há uma Palavra derramando bondade, sabedoria, beleza e alegria em cada criatura. Deus é visto, amado, adorado em tudo o que fez e faz; por isso montar o presépio é para Francisco de Assis,  ajeitar cada criatura em seu lugar para dizer da amabilidade de Deus. Para Francisco, o presépio é um sermão sem palavras, uma pregação silenciosa. Não precisa dizer nada, basta estar ali. Deus, a humanidade, o universo, as criaturas tudo mais são perfeições que tornam Deus desejável. Aliás, o presépio é a fala de Deus a clamar: desejei estar aqui! A sabedoria divina tem seus atalhos e Francisco descobriu as trilhas sem se perder na floresta do desejo de desejar Deus. O presépio foi um parceiro de conversa, igual a como e quando conversamos com um fim de tarde na roça. Ou será uma declaração de amor? Porque não existe declaração de amor que não reúna tudo o que há debaixo do céu. Para Francisco de Assis, o presépio é uma declaração de amor encarnada e mostra as possibilidades do amor entrando na vida por inteiro. É a Palavra que temos que ver, ouvir, sentir e saborear. A face de Deus está ali num mundo de reflexos para crer e ver, receber a vida como glória de Deus e paz na terra, cheia de vontade boa.  Se você vê e ama, não tem como ir embora. Diante do presépio é melhor permanecer para reviver, tornar-se vivo na mesma visão beatífica. Nem todos os livros e pregações, nem todas as bibliotecas e oficinas, nem todos os movimentos espirituais e seus mentores são capazes de conter e contar a comunicação de Deus do jeito que Francisco conta para nós. No princípio havia a Palavra; em 1223 havia Greccio, no século XIII e até hoje existe Francisco mostrando o Natal como nosso eterno presente.

CONTINUA

FREI VITORIO MAZZUCO FILHO

Imagem ilustrativa: Presépio da Exposição Franciscana do Convento São Francisco (SP)

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