REFLEXÕES SOBRE A DIMENSÃO POLÍTICA DO FRANCISCANISMO - 2

"O Evangelho não é apenas um texto bonito para ser lido"


Francisco de Assis fez uma rara aproximação com Deus abraçando o pobre com braços da Boa Nova. Abraçar o leproso, o maior ícone libertador de um processo penitencial e de conversão, foi um enlaçamento de vidas, um gesto profético, uma indignação ética, uma proximidade terna e vigorosa para mostrar que a exclusão é desumana e não agrada o Pai das Misericórdias. Abraçar o leproso foi mais que um encontro espiritual. Ali braços, lábios e rostos se entrelaçaram e apontaram o caminho de São Damião; e lá estava um Deus misturado no jeito abandonado das ruínas, um Deus despojado e crucificado.

A partir de então, Francisco de Assis percebe que a pobreza não é um indivíduo, mas um lugar social. A partir deste lugar ele sai para realizar um movimento de transformação pessoal e coletivo. Se existe o pobre é porque alguém ou uma estrutura produziu o pobre. Ele estava e vivia numa família e numa sociedade opulenta, e numa eclesiologia não menos opulenta. E não escolheu permanecer ali. Jesus Cristo não permaneceu na oferta feita pela tentação dos poderes de riqueza, segurança e adoração confortável. Jesus fez estrada nos empoeirados lugares da Palestina. Do estábulo de Belém, do jeito caseiro de Nazaré, para uma imersão no mundo dos que mais precisavam da presença de quem sonhava para este mundo o Reino. O leproso representa os paralíticos e cegos, os raivosos fariseus, a viúva de Naim, o Lázaro que volta à vida, a pecadora condenada que ia ser coberta de pedras, os doentes e exluídos do tempo, que só podiam contar com sua presença, toque, palavra e cura. O Evangelho não nasceu apenas dos pergaminhos da Palavra; o Evangelho nasceu resolvendo a história, mudando vidas, proclamando a justiça, anunciando a paz e a libertação, concretizando Isaías, ampliando a Lei, derramando o sangue dos apóstolos e mártires, e trazendo o sadio para a existência.

Francisco abraçou primeiro o leproso que surgiu no caminho, e depois foi abraçar a cruz de São Damião, o marco indicativo e final de um caminho glorioso de ressurreição. O Evangelho não é apenas um texto bonito para ser lido e comentado; ele é um programa de vida para aqueles que querem abraçar um Deus sangrando por amor do mundo e da humanidade. A Vida e a Regra do Irmão e Irmã é esta, viver o Libertador Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo.

continua

FREI VITÓRIO MAZZUCO FILHO

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