DE JUBILEU EM JUBILEUS – 9
No ano de 2023 celebramos o Jubileu da Regra Bulada (1223)
que como fonte de Espiritualidade é união de vidas segundo o Espírito, é
proposta da busca de ser melhor e mais evoluído a partir do momento que se
abraça uma forma de vida, um caminho de interioridade e fraternidade, a pedra
angular da reconstrução. Espiritualidade é caminho feito com passos de fé
acreditando em algo grandioso. Uma Regra
Franciscana porque, neste caminho se refaz os passos e a inspiração de um
convertido. A conversão de Francisco não é um ardor momentâneo, mas um modo de
ser que atravessa oito séculos. Os que seguem estes passos são perseguidos pela
Graça; e ajudados pela intuição franciscana, se organizam para construir uma
nova humanidade.
No ano de 2023 celebramos o Presépio de Greccio (1223). Para
Francisco de Assis o presépio resplandece a divindade e a humanidade de Jesus
Cristo numa bela teofania, a mais bela de todas, e por isso precisa de
homenagem! Fazer presépio é honrar de um modo luminoso a luminosa presença de
Senhor em nossa história. Presépio não é ajuntamento de imagens, mas comunhão
com Deus por meio da percepção e da gratidão. Se a Palavra se fez criatura, as
criaturas se reúnem para proclamar a Palavra que veio ser como nós: pessoa! O
presépio é o estar junto, estar em casa, ver, contemplar, viver com e viver por
uma causa. Um Reino que abraça o universo a partir de uma manjedoura, um trono
simples para um Menino Rei humanizado. Nele a gloria é visível. “Quem me vê, vê
o Pai” (Jo 14,7).
Neste ano de 2024 celebramos os Estigmas (1224): “Homem
novo, Francisco tornou-se famoso por novo e estupendo milagre: por singular
privilégio, jamais concedido nos séculos anteriores, apareceu assinalado, ou
ornado, com os sagrados estigmas, configurando o seu corpo mortal ao corpo do
Crucificado. Tudo o que a humana língua possa dele falar sempre estará aquém do
louvor de que é digno. Inútil procurar a razão, porque é maravilhoso, nem se
trata de buscar um exemplo, pois é único. Todo o empenho do homem de Deus, quer
em público, quer em particular, dirigia-se para a Cruz do Senhor. Desde o
primeiro instante em que começara a servir sob o Crucificado, diversos
mistérios da Cruz resplandeceram em torno dele” (3Cel 2,1).
Quem centra a sua vida numa determinada busca, numa focada
paixão, num visível enamoramento, percebe claramente que o sentido deste Amor
vai aparecendo nas nuances da vida. O que amamos nos surpreende em evidentes
sinais como uma reveladora novidade. Francisco
de Assis foi estigmatizado, e os estigmas são como as marcas do Crucificado que
São Paulo dizia trazer consigo. Um humano renovado se molda sobre um caminho de
grandes desafios e porque não, de sofrimento? O Amor deixa marcas, e amar tem a
sua glória e cruz, tem a sua flor e dor. Toda renovação vai à fonte inicial da
vida que é parida em dor. E podemos perguntar: o que tem de humanidade nova
nisto, o que tem de novidade? A novidade presente em sofrer por amor é muito
raro na literatura espiritual antiga. Vamos encontrar no antigo Império Romano,
a presença do termo novus ou novitas, no discurso de Cícero, orador romano, na
sua peça de oratória, chamada “Pro Murena”, onde ele defende que não devemos
ignorar as marcas deixadas pelo sofrimento nos caminhos da consolação. Para
Cícero, as marcas da dor são glórias da luta. Cícero escreve isto para Murena,
um senador romano, dizendo para ele que “as virtudes de um senador são mais
importantes que o seu nascimento”. As marcas deixadas pelo Amor não são sofrimento
pelo sofrimento, mas reconhecimento.
Em 2025, vamos celebrar O Cântico das Criaturas (1225), um
hino sensível e poético, como um salmo feito para exaltar elementos
fundamentais da vida e une o mundo exterior e interior. Uma escada mística com
a qual se faz um caminho entre céu e terra, espírito e matéria, humano e
divino. São Francisco de Assis nos faz degustar, com olhar contemplativo,
conhecimento e vivência dos elementos da natureza e decifra através da terra,
fogo, água e ar, sol, lua, estrelas, vento, nuvens, frutos, flores e ervas, o
livro da vida em sua mais bela expressão e reconcilia os conflitos com perdão e
paz na tribulação. A morte é bem-vinda como irmã se a vida é vivida num serviço
de grande humildade. Ele mostra uma estrada para chegar a Deus altíssimo e bom
Senhor: através de suas obras.
O Cântico das Criaturas é espelho das condições de vida.
Nascer, morrer, reviver, estar em harmonia; semear paz e perdão em meio a
tensões que nos cercam. Um espelho de sentidos que se comunica através do
simbólico, do visível, do belo e do bom. Ele nos devolve o paraíso que perdido
que vamos destruindo. O corpo da existência é visto com os olhos do espírito
para se ter uma reverente imagem do mundo. Uma das características do Cântico é
o feminino e o masculino como sinais de unidade e totalidade psíquica do humano
e sua forte identidade. São Francisco de Assis canta o Irmão Sol, a Irmã Lua, o
Irmão fogo e a Irmã água, a senhora Mãe e Irmã terra. A comunhão com o céu e a
comunhão fraterna com os seres da terra e tudo integra.
Em 2026, teremos a Morte de Francisco como celebração, vamos
comemorar os 800 anos de seu Transitus, a sua passagem para a eternidade. Ele
mesmo canta em seu famoso hino: “Louvado sejas, meu Senhor, por nossa Irmã, a
morte corporal”. Francisco é um ser
humano reconciliado com a vida e integra a morte na totalidade da existência,
morrer é o ciclo inevitável da vida. A morte deixa de ser um momento para ser
um processo, ela não é o oposto da vida, mas faz parte essencial da vida. A morte
tira o vínculo físico, mas jamais o vínculo afetivo. Como Jó, Francisco saciado
de viver, morreu. Seu amor o eterniza no tempo e ele se torna um benefício
existencial.
Estes anos onde comemoramos todos estes jubileus recontam a
história de Francisco e resgatam os grandes valores franciscano como uma nova
Legenda moderna de um medieval sempre atual, que empurra a nossa história, a
nossa vida, a nossa espiritualidade para um futuro absoluto, um amanhã pleno de
luz. Em louvor de Cristo. Amém!
FREI VITORIO MAZZUCO FILHO
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Imagem: Musei Vaticani
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