O mal-estar na civilização
Freud, 1929; volume XXI, cap. IV
Freud, neste capítulo, faz uma suposição acerca da formação da família, dizendo que a necessidade de satisfação genital “não apareceu mais como um hóspede que surge repentinamente e do qual, após a partida, não mais se ouve falar por longo tempo, mas que, pelo contrário, se alojou como um inquilino permanente”. A partir daí, o macho quis conservar a fêmea junto de si, seu objeto sexual. A fêmea, por sua vez, não querendo separar-se de seus rebentos indefesos, viu-se obrigada a permanecer com o macho mais forte. Tem-se, então, o início da vida comunitária, a qual teve um fundamento duplo (dois pontos) a compulsão para o trabalho – momento em que o homem percebeu que a sorte na terra estava em suas mãos, cuidando-a e utilizando-a para seu sustento, paralelamente necessita de um companheiro para esse novo modo de vida – o trabalho, e o poder do amor, que fez o homem relutar em privar-se de seu objeto sexual – a mulher (a mãe) – e a mulher, em privar-se daquela parte de si própria que dela fora separada – seu filho. Eros e Ananke (amor e necessidade) se tornaram os pais da civilização humana.
Esses dois grandes poderes cooperaram para que um número bastante grande de pessoas pudesse viver reunido numa comunidade. Supunha-se que o desenvolvimento ulterior da civilização progredisse sem percalços no sentido de um controle ainda melhor sobre o mundo externo - tanto da terra quanto do outro e no de uma ampliação do número de pessoas incluídas na comunidade. Observou-se, contudo, que essa civilização não agiu de forma a proporcionar a total felicidade, pois o amor tem em sua raiz um grande paradoxo (felicidade x infelicidade), o qual se dissolve em parte pela sublimação.
O amor sendo um dos fundamentos da civilização, deu-se com a descoberta feita pelo homem de que o amor sexual (genital) lhe proporcionava as mais intensas experiências de satisfação, fornecendo-lhe, na realidade, o protótipo de toda felicidade, sugerindo-lhe que continuasse a buscar a satisfação da felicidade em sua vida seguindo o caminho das relações sexuais e que tornasse o erotismo genital o ponto central dessa mesma vida.
Sendo assim, o homem tornou-se dependente, de uma forma muito perigosa, de uma parte do mundo externo, do qual lhe escapa o controle, isto é, de seu objeto amoroso escolhido, expondo-se a um sofrimento extremo, caso fosse rejeitado por esse objeto ou o perdesse através da infidelidade ou da morte.
Freud diz que nem todas as pessoas estão preparadas para o amor. Uma pequena minoria pode, devido à sua constituição, achar a felicidade pela via do amor, mas isso requer vastas alterações psíquicas na função amorosa. Tais pessoas se fazem independentes da concordância do objeto, ao deslocar o peso maior de ser amado para o ato de amar; elas se protegem da perda do objeto, e voltam então seu amor de forma igualitária para todos os indivíduos e não para objetos isolados, sem exigirem a exclusividade, como é o caso do amor genital. Desta forma evitam as oscilações e decepções do amor genital, que lhe consome um quantum de energia.
Com esta atitude, o homem se afasta da meta sexual do amor, transformando o instinto em um impulso ‘inibido em sua finalidade’.
Este amor transformado produz em si mesmo um estado de sentimento uniforme, terno, estável, já não tendo muita semelhança exterior com a vida amorosa genital, tempestuosamente agitada. Nessa utilização do amor para o sentimento interior de felicidade quem mais avançou, diz Freud, foi talvez São Francisco de Assis. Este viveu de forma sublimatória, deslocando a energia sexual para fins sociais em prol da humanidade, deixando sua marca de desprendimento material, substituído pelo amor universal.
Freud, neste capítulo, faz uma suposição acerca da formação da família, dizendo que a necessidade de satisfação genital “não apareceu mais como um hóspede que surge repentinamente e do qual, após a partida, não mais se ouve falar por longo tempo, mas que, pelo contrário, se alojou como um inquilino permanente”. A partir daí, o macho quis conservar a fêmea junto de si, seu objeto sexual. A fêmea, por sua vez, não querendo separar-se de seus rebentos indefesos, viu-se obrigada a permanecer com o macho mais forte. Tem-se, então, o início da vida comunitária, a qual teve um fundamento duplo (dois pontos) a compulsão para o trabalho – momento em que o homem percebeu que a sorte na terra estava em suas mãos, cuidando-a e utilizando-a para seu sustento, paralelamente necessita de um companheiro para esse novo modo de vida – o trabalho, e o poder do amor, que fez o homem relutar em privar-se de seu objeto sexual – a mulher (a mãe) – e a mulher, em privar-se daquela parte de si própria que dela fora separada – seu filho. Eros e Ananke (amor e necessidade) se tornaram os pais da civilização humana.
Esses dois grandes poderes cooperaram para que um número bastante grande de pessoas pudesse viver reunido numa comunidade. Supunha-se que o desenvolvimento ulterior da civilização progredisse sem percalços no sentido de um controle ainda melhor sobre o mundo externo - tanto da terra quanto do outro e no de uma ampliação do número de pessoas incluídas na comunidade. Observou-se, contudo, que essa civilização não agiu de forma a proporcionar a total felicidade, pois o amor tem em sua raiz um grande paradoxo (felicidade x infelicidade), o qual se dissolve em parte pela sublimação.
O amor sendo um dos fundamentos da civilização, deu-se com a descoberta feita pelo homem de que o amor sexual (genital) lhe proporcionava as mais intensas experiências de satisfação, fornecendo-lhe, na realidade, o protótipo de toda felicidade, sugerindo-lhe que continuasse a buscar a satisfação da felicidade em sua vida seguindo o caminho das relações sexuais e que tornasse o erotismo genital o ponto central dessa mesma vida.
Sendo assim, o homem tornou-se dependente, de uma forma muito perigosa, de uma parte do mundo externo, do qual lhe escapa o controle, isto é, de seu objeto amoroso escolhido, expondo-se a um sofrimento extremo, caso fosse rejeitado por esse objeto ou o perdesse através da infidelidade ou da morte.
Freud diz que nem todas as pessoas estão preparadas para o amor. Uma pequena minoria pode, devido à sua constituição, achar a felicidade pela via do amor, mas isso requer vastas alterações psíquicas na função amorosa. Tais pessoas se fazem independentes da concordância do objeto, ao deslocar o peso maior de ser amado para o ato de amar; elas se protegem da perda do objeto, e voltam então seu amor de forma igualitária para todos os indivíduos e não para objetos isolados, sem exigirem a exclusividade, como é o caso do amor genital. Desta forma evitam as oscilações e decepções do amor genital, que lhe consome um quantum de energia.
Com esta atitude, o homem se afasta da meta sexual do amor, transformando o instinto em um impulso ‘inibido em sua finalidade’.
Este amor transformado produz em si mesmo um estado de sentimento uniforme, terno, estável, já não tendo muita semelhança exterior com a vida amorosa genital, tempestuosamente agitada. Nessa utilização do amor para o sentimento interior de felicidade quem mais avançou, diz Freud, foi talvez São Francisco de Assis. Este viveu de forma sublimatória, deslocando a energia sexual para fins sociais em prol da humanidade, deixando sua marca de desprendimento material, substituído pelo amor universal.
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